segunda-feira, abril 11, 2005

Contradizendo-se

Surpreendi meu primo beijando a namorada na sala do seu apartamento. Na hora tinha mesmo que falar com ele, apesar de me recriminar agora por ter feito aquilo. Envolvia o pescoco da moca com o braço direito beijava devagar o canto de sua boca e ela sorria porque a pouca barba de adolescente fazia cócegas no seu rosto leve e fresco. Ria mesmo como criancinha, como se sentisse vergonha e só não o irritava porque ele estava completamente envolvido na mocinha, o cheiro, o tato da pele, o riso pela barba, daí cortei abruptamente o beijo deles - que linda cena! O Fernão tá nos esperando lá em baixo, bora!
A namorada dele me olhou com uma surpresa e depois com um desgosto que só tinha visto naqueles vídeos reais da segunda guerra quando separavam as familias nos campos de concentração!
De todo jeito, fomos jogar bola naquele sábado, para relaxar e brincar um pouco. Todos viam que meu primo estava completamente apaixonado, era flagrante e tão transparente quanto a luz dos seus olhos azuis, motivo pelo qual recebeu uma boa gozação dos primos e amigos. Primeiro quis fingir que não, mostrando um pouco de receio, mas depois, brincando e dizendo a verdade ao mesmo tempo, elogiou o beijo e o sorriso, acrescentando a infalível máxima machista - e é tudo meu! - inseguro para que continuassem a pilhéria.
Ser homem é parecer forte! Pois que idéia estúpida! Como se desprezo e arrogância fossem força... mas não sou o juiz da conduta de ninguém além da minha própria e por isso sosseguei, mas que bobagem se deixar intimidar quanto ao que sente porque meia dúzia de priminhos zombeteiros estão por perto! Vai saber... uns dizem que é da idade, mas covardia não tem idade, mas não sei por que não conheço velhos covardes, todos que conheço gostam de cantar alguma vantagem e não se importam nem um pouco com que os outro dizem deles ou com o que vão pensar. Claro, é preciso haver um pouco de noção sobre a origem e a finalidade de tudo, afinal, expor os próprios sentimentos é matéria delicadíssima e quando brinca-se com os sentimentos de alguém, brinca-se com uma coisa que tem valor e muito! Mas é justamente por ser difícil e delicado, que nessa hora o rapaz tem que assumir mesmo se é romântico ao invez de vestir a confortável carapuça de cafajeste e dizer o que é seu ou o que não é.
Voltamos para casa e meu primo ansioso, sem confessar essa condição, para resolver o problema com a namorada, afinal não tinha avisado do jogo e a deixou com cara fechada. Um cheiro inebriante de milho cozido na cozinha da casa de nossa avó e o rapaz suado indo ao telefone de casa e disparando que tinha se esquecido do jogo, mas que não podia deixar de ir, que era circunstancial, que issos, que aquilos, que agora se sentia estúpido... cansado de ouvir aquilo fui pra minha casa tomar banho e depois saí pra rua.
Encontrei os dois de novo, perto do jardim municipal, encostados num banco, ennganchados, meu primo com as costas na parede e as pernas abertas e a namorada agarrando seu pescoço no beijo, tanto mais junto quanto a física permite.