quinta-feira, junho 17, 2010

Olhos nos olhos

Não diria que Deus é vingativo, como muita gente gosta de dizer. Diria que as coisas que fazemos voltam para nós mesmos, as boas e as más. Antes de acreditar que a infinita bondade e o infinito amor que é Deus são responsáveis por essas maçadas da vida, antes vale ver o caminho por onde se anda, especialmente aqueles sítios onde ao invés do sacrifício para o bem comum, foi visado só um interesse pessoal e egoístico, onde ao invés de esperança e fé, deu-se lugar ao oportunismo e a leviandade, onde a humilhação e a opressão impunham perseverança, deu-se lugar a uma desistência fraca e uma retirada em precipitação.

É um longo caminho por onde passamos, a nossa vida. Vejo-o nos gatos de rua que moram aqui em frente de casa. Se de manhã matam-se a miar pelo pequeno almoço trazido pela dona Fernanda, ao meio da tarde, quando vem o sol quente, desaparecem para algum refúgio fresco, suspeito eu, longe dessas paragens. Mas depois que o sol esmorece, voltam mansinhos a ocupar as suas posições de costume. Fazem da vida essa rotina de estar juntos, nem sempre a lamber-se, mas certamente sempre a contar uns com os outros. Um é chefe e dá as ordens. Os outros obedecem ou então levam na cabeça, que é para aprender de uma vez.

Na sua charmosa bestialidade, os gatos em muito mostram o nosso comportamento (com vantagens notáveis, é verdade: a liberdade, a graça, o desprendimento, a sutileza, etc.). De certo que ignoram de todo a existência de Deus e no alto da sua consciência animal, o certo e o errado levam ao limite do convívio social e da sobrevivência na sua sociedade patriarcal. Todos se submetem as ordens do macho dominante e cada um tem uma função nessa sociedade, porque sabem que juntos tem chances melhores e porque são animais sociáveis, também é verdade.

Ser "esperto como os gatos" talvez também passe por aí. Saber que os verdadeiros vencedores são todos "team players", ou seja, não há êxito verdadeiro quando se mira só o próprio umbigo: vão faltar apoios, vão faltar motivos, vão faltar alegrias.

Sintomático de que o homem (e também a mulher, por que não?!) deve voltar-se para fora de si mesmo é esse magnífico evento: o mundial de futebol, ou a Copa do Mundo. Assim como os gatos que protegem-se uns aos outros, uns de alerta enquanto os outros dormem, também a equipa que vai vencer esse torneio contará com jogadores que salvaguardam as costas dos outros. O gato que conquista um belo petisco não pode tê-lo só para si: sabe que a boa nutrição do grupo é que vai lhe garantir boas performances amanhã. Também o avançado que não passa a bola para o companheiro melhor posicionado para marcar vai ter menos hipóteses de ver sua equipa sair vitoriosa.

Assim, o que se passa com os gatos, o que se passa com os futebolistas, passa-se com toda a gente, em todo o lado, da mesma forma. Põe a mente e o coração para fora de ti mesmo e vais ver Deus na plenitude. Não o Deus vingativo e ditador que os pagãos e ateus gostam de pintar, mas o Deus que é amor, caridade e verdade.

Mas se esse discurso filosófico-religioso, com alegorias a gatos e à Copa do Mundo, não te convence, segue o teu caminho reto dentro de ti mesmo, mas saiba que ele conduz a um destino torto.