As grandes cidades do mundo talvez deem-se as maos nessa grande angustia do desconhecimento, um desconhecer que nao e' propriamente ignorancia, e' um facto da vida.
Desconhecem-se uns aos outros, desconhecem os caminhos inabituais, desconhecem, por pior que pareca, a si mesmos.
Vivemos aqui juntos, 7 milhoes de londrinos, sob a constante sugestao do prefeito da cidade para que passemos a andar de bicicleta e abandonemos os carros e o metro, achando piada do quanto o novo primeiro ministro bajula os americanos enquanto esnoba os franceses e alemaes... a espreita de algum arabe com olhos arregalados que queira explodir a si mesmo e a tantos quantos estiverem proximos a si, com essa estranha e curiosa pre-disposicao para apreciar humor negro e sarcasmo, com esse despeito pelos dias de sol e os grandes sorrisos com os copos de cerveja de 600 ml nas maos do lado de fora dos pubs a partir das 5 da tarde.
Curto imensamente o modo de vida dos britanicos, especialmente a sua capacidade de serem gentis sem que com isso significar que se importam, nem por isso... e' uma gentileza de estirpe, nao que significa respeito pela outra pessoa. Agrada-me o bom gosto no vestir, especialmente dos homens e das mulheres com mais de 25 anos... as mais novinhas vestem-se como as americanas e portanto, vestem-se como macacas de circo que vao andar naqueles triciclos pequeninos, com grandes bandanas de bolinhas na cabeca e calcas colantes sob as saias... nao chega a perturbar o ambiente de todo. E' bom tomar cerveja para acompanhar o file' de peixe frito e as batatas fritas, o prato nacional por excelencia, e gastar as preguicosas tardes de domingo com os amigos num pub aconchegante e belo como todos os pubs tradicionais sao.
Tanta imersao cultural e eu assim tao submergido, entre o antes e o agora e o depois, esse lapso tonto de acordar 'a tarde com a sensacao que perdeu-se um compromisso... mas nao ha' nada, ficou so' a sensacao e umas saudades com olhinhos tristes de orfa a mendigar moedinhas para um pedaco de pao, um beijinho com carinho, alguma palavra de afecto.
Cinza leve a vagar junto da brisa fria e constante, espectro morbido e jocoso do que um dia foi a minha louca fantasia em brasa, um deboche intimo e cruel, uma maldicao que lanco silenciosamente quando o odio me inflama discretamente antes de converter-se novamente em amor, com o alarde brutal da minha paixao... E repete-se ao infinito os versinhos queridos que me dizem tanto:
'Parte, e tu verás
Como o que era real, resta impreciso
Como é preciso ir por onde vais
Com razão, sem razão, como é preciso
Que andes por onde estás.'
Plena tarde de verao, beijos ao ar, moedas nas fontes da Trafalgar Square, pensamentos distantes 'a beira do Tamisa... tao quente submersao sentimental na capital do Reino Unido.