Che Guevara
Para mim é impossível olhar o mapa da América Latina sem lembrar da feliz alcunha que Eduardo Galeano usou para referir-se ao nosso continente: um coração eternamente a sangrar.
Nunca antes da leitura do clássico da literatura de jornalismo político, "As veias abertas da América Latina’, da autoria de Galeano, tinha percebido a grandeza e a robustez do mito que meu continente corajosamente encarnou e encarna: à dura missão de ter tomado para si o sonho iluminista de liberdade, igualdade e fraternidade não poderia nunca mensurar as vezes em que seu grito de horror face à injustiça fora impiedosamente sufocado no decorrer destes 5 séculos de tenaz existência.
Desde o Rio Grande até a Terra do Fogo, fomos marcados pela sina do sonho, da fantasia, da traição pelo covarde e da capitulação ao inimigo que nos ambiciona o corpo e as virtudes, mas mesmo depois de tantas mentiras, depois de tantas traições, de tantas lágrimas, seguimos irremediavelmente como adeptos do sonho, como se não houvesse para um latino a hipótese de desistir do seu sorriso e da sua esperança, o que certamente é difícil de perceber a um estrangeiro, mas que para nós faz sentido instintivamente.
Quando os movimentos de esquerda ganharam força na América Latina a partir do final dos anos 50 e principalmente nos anos 60, não havia propriamente um levante para se instaurar uma grande União Soviética latina, mas sim um desejo unânime de igualdade social e democracia efetiva, em substituição aos velhos sistemas de dominação política das aristocracias tradicionais, com suas eleições forjadas e seus governantes submissos a interesses particulares e dos estrangeiros, enquanto o interesse do povo latino-americano ficava à mercê das sobras que houvessem, a tentar a felicidade apenas com o surrealismo ocasional de suas vidas, o culto aos grandes futebolistas, as festas religiosas e com um pouco de sorte uma pequena querida a sorrir-lhes.
As grandes veias abertas da América Latina foram notadas pela juventude filha de sua influente classe média quando deparou-se com questões como desenvolvimento sustentável, recursos naturais e remessa de lucros para o estrangeiro, entre outras fontes de mazelas. Os recursos que faltavam ao Estado para promover inclusão social dos pobres, para investir em educação, para emprestar aos que sonhavam em ter seu negócio, ou mesmo para investir em infra-estrutura, como boas estradas e bons portos, escapava entre os dedos de uma mão que assinou indulgentemente generosas anistias fiscais para empresas estrangeiras explorarem o inesgotavelmente rico subsolo do nosso continente, uma mão que tomou suborno para censurar a imprensa e fechar partidos políticos, uma mão que foi apertada pelos seus senhores em cumprimento pela opressão da inteligência e da liberdade latino-americanas.
Houve, entretanto, quem prezava imenso pela nossa terra para encarar todos esses crimes e querer levar a vida como se nada estivesse a acontecer, houve gente que não se contentou em ouvir mentiras e ser covarde, houve gente que mereceu ser assim chamada.
Assim, houve luta armada contra as ditaduras e contra a opressão de maneira geral em Cuba, no México, na Argentina, no Chile, na Bolívia, no Brasil e em mais tantos outros lugares onde heróis anônimos resolveram gritar que nada daquilo estava certo e que era tempo de nos unirmos para fazermos valer nossa liberdade de decidir por nós mesmos, de pensarmos na nossa felicidade, para que pudéssemos sonhar com um futuro de prosperidade e mais que tudo, com um futuro de honradez política e social.
Muitas dessas lutas foram brutalmente sufocadas e mesmo que algumas vezes tenha havido sucesso nos seus propósitos, não é isso que fez umas maiores ou mais nobres que as outras. É sempre a coragem de sermos quem somos que nos faz livres, não um papel onde estão escritos direitos, ou nossos bens, ou a trama sofisticada de interesses que reúne pessoas que se chamam umas às outras de amigas.
Nunca antes da leitura do clássico da literatura de jornalismo político, "As veias abertas da América Latina’, da autoria de Galeano, tinha percebido a grandeza e a robustez do mito que meu continente corajosamente encarnou e encarna: à dura missão de ter tomado para si o sonho iluminista de liberdade, igualdade e fraternidade não poderia nunca mensurar as vezes em que seu grito de horror face à injustiça fora impiedosamente sufocado no decorrer destes 5 séculos de tenaz existência.
Desde o Rio Grande até a Terra do Fogo, fomos marcados pela sina do sonho, da fantasia, da traição pelo covarde e da capitulação ao inimigo que nos ambiciona o corpo e as virtudes, mas mesmo depois de tantas mentiras, depois de tantas traições, de tantas lágrimas, seguimos irremediavelmente como adeptos do sonho, como se não houvesse para um latino a hipótese de desistir do seu sorriso e da sua esperança, o que certamente é difícil de perceber a um estrangeiro, mas que para nós faz sentido instintivamente.
Quando os movimentos de esquerda ganharam força na América Latina a partir do final dos anos 50 e principalmente nos anos 60, não havia propriamente um levante para se instaurar uma grande União Soviética latina, mas sim um desejo unânime de igualdade social e democracia efetiva, em substituição aos velhos sistemas de dominação política das aristocracias tradicionais, com suas eleições forjadas e seus governantes submissos a interesses particulares e dos estrangeiros, enquanto o interesse do povo latino-americano ficava à mercê das sobras que houvessem, a tentar a felicidade apenas com o surrealismo ocasional de suas vidas, o culto aos grandes futebolistas, as festas religiosas e com um pouco de sorte uma pequena querida a sorrir-lhes.
As grandes veias abertas da América Latina foram notadas pela juventude filha de sua influente classe média quando deparou-se com questões como desenvolvimento sustentável, recursos naturais e remessa de lucros para o estrangeiro, entre outras fontes de mazelas. Os recursos que faltavam ao Estado para promover inclusão social dos pobres, para investir em educação, para emprestar aos que sonhavam em ter seu negócio, ou mesmo para investir em infra-estrutura, como boas estradas e bons portos, escapava entre os dedos de uma mão que assinou indulgentemente generosas anistias fiscais para empresas estrangeiras explorarem o inesgotavelmente rico subsolo do nosso continente, uma mão que tomou suborno para censurar a imprensa e fechar partidos políticos, uma mão que foi apertada pelos seus senhores em cumprimento pela opressão da inteligência e da liberdade latino-americanas.
Houve, entretanto, quem prezava imenso pela nossa terra para encarar todos esses crimes e querer levar a vida como se nada estivesse a acontecer, houve gente que não se contentou em ouvir mentiras e ser covarde, houve gente que mereceu ser assim chamada.
Assim, houve luta armada contra as ditaduras e contra a opressão de maneira geral em Cuba, no México, na Argentina, no Chile, na Bolívia, no Brasil e em mais tantos outros lugares onde heróis anônimos resolveram gritar que nada daquilo estava certo e que era tempo de nos unirmos para fazermos valer nossa liberdade de decidir por nós mesmos, de pensarmos na nossa felicidade, para que pudéssemos sonhar com um futuro de prosperidade e mais que tudo, com um futuro de honradez política e social.
Muitas dessas lutas foram brutalmente sufocadas e mesmo que algumas vezes tenha havido sucesso nos seus propósitos, não é isso que fez umas maiores ou mais nobres que as outras. É sempre a coragem de sermos quem somos que nos faz livres, não um papel onde estão escritos direitos, ou nossos bens, ou a trama sofisticada de interesses que reúne pessoas que se chamam umas às outras de amigas.
Foi a covardia que nos assassinou muitas vezes. Mesmo que em qualquer campo da convivência humana sempre exista os que se protegem atrás das pedras e esperam passar a fera e outros que se lançam contra ela, porque não querem passar a vida a comer raízes e restos do chão e precisam mesmo de carne, não é sensato deixar escapar a lição de que aos fracos cabe precisamente a mediocridade e a submissão.
Hoje temos nossas jovens democracias cheias de uma ânsia imensa de recuperar o tempo perdido, de incluir os pobres nos grupos de consumo, de prover educação a todos e em todos os níveis, de integrar os países irmãos, de valorizar a nossa cultura e o nosso povo como melhores expoentes da nossa verdade, de tudo que temos para dar ao mundo, não mais o sangue das nossas veias abertas, mas sim o sorriso confiante e afetuoso que lançamos a um futuro quando as duras lições do passado serão lembradas apenas pelo estudo da história.
Um coração sempre apaixonado e corajoso em honra aos grandes leões da América Latina.
Um coração sempre apaixonado e corajoso em honra aos grandes leões da América Latina.