quarta-feira, outubro 14, 2009

Devagar para não faltar amor

Em meio às confusões do início do ano académico, contribuiu para o convívio dos colegas do ano passado a conferência sobre a suprema corte de Israel. Interessante não seria o termo. Digamos que a conferência em si foi informativa e que ri uma ou duas vezes do sotaque do palestrante, magistrado dessa corte.
Mais a mais, aquilo era uma boa centena e meia de alunos da licenciatura, meio sem perceber aquele inglês internacional, meio distraídos em olhar uns pros outros e ninguém de facto muito interessado na imparcialidade da corte maior do estado judeu. Por acaso não vi lá o Francisco, a quem a palestra teria interessado para além do aspecto puramente académico, digamos.
Uns lá, a se fazerem de bravos, levantavam grandes argumentos sobre o tratamento isonómico de todos os cidadãos israelenses, judeus ou não, outros a baterem-se pelo sagrado direito de defesa do estado judeu para justificar acções abusivas contra uma população palestina desarmada e miserável... Se algum dia fechei fileiras com esses, já não é mais assim, não vou mais por esse caminho. É tolice.
Não digo que seja tolice defender uma ideia com ardor, bater-se por ela, querer vê-la ganhar corpo nos corações e mentes dos outros. Se for um propósito digno e justo, ora que belo sentido para se dar à vida! Muito melhor do que viver de maneira leviana e consumista, ao capricho das aparências e dos modelos de carros.
O que acho que não cabe bem é levantar-se para ocupar o silêncio com a voz no sentido de querer ganhar uma atenção fácil e desmerecida... Nesses empenhos, nenhum proveito é colhido pelo ouvinte. Talvez iludido por alguma bela palavra, algum artifício de linguagem, deixa-se levar pelos primeiros minutos, vai confiando por algum desejo secreto de satisfazer a curiosidade de que aquilo faz sentido ou vai dar a algum lado. Não, nem por isso. As pessoas apenas cometem esses crimes contra o silêncio por amor a si mesmas, querem atenção, querem ser notadas, querem os elogios, os olhares, a confirmação de que sua existência tem propósito e sentido. Que débeis criaturas somos nós quando nos deixamos levar pelos valores errados!
Já agora é melhor ir devagar. Ouvir e calar. Não por medo acovardado em levantar a voz, mas simplesmente porque não vale a pena dar combate à bravata e à estupidez. Ambas arruinam-se no seu triste labirinto de véus de vaidade, cansam-se uma da outra e apunhalam-se mutuamente em traição.
Confio, assim, que um caminho de discrição e pouco riso (quando possível, pois é muito difícil) reserva mais doçura, mais proveito para o aprendizado e, certamente, amor para não faltar nunca a ninguém que o mereça.