Eu achei piada quando ouvi que os arcos que ficam entre o Instituto de Botânica e a Junta de Freguesia da Sé Nova eram parte do sistema de aquedutos de Salazar... Claro que eram um bocado mais antigos, mas não tinha me atrevido a considerar que vinham da ocupação romana... pois a verdade é que são tão romanos quanto nossa herança de opressão e vaidade e nosso alfabeto latino.
A história de Coimbra é tão cheia de pormenores, que passenado ali pelos arcos romanos, reparei uma bizarrice que no final das contas tinha lá sua surpreendente razão de ser.
Bem às costas da estátua do sto. padre João Paulo II, no alto dos arcos, há uma outra imagem que a princípio não pude ver bem de quem era.
Estando ao pé da Junta de Freguesia e sabedor do vasto conhecimento em termos de história coimbrã que o seu presidente possui, fui lá ter sem nenhum outro pretexto.
Após uma espera de menos de 2 minutos, o gentil senhor que já me conhece pelo primeiro nome elogiou a "perspicaz" observação e informou que a tal imagem era de São Sebastião. Isso eu bem achei que era, afinal não faltam aos olhos da imagem uma infinita expressão de dor e resignação.
Entretanto, eu logo interpus objecção: Mas então onde estão as setas?
"Bem, jovem mancebo, houve uma noite de inverno em que o frio era muito e o vento soprava suas tramadas rajadas de desconsolo. Desciam da universidade, entretanto, muitos capas-pretas com as bochechas vermelhas, traziam guitarras e de certeza eram lá alguma tuna que tinha acabado de se apresentar.
A odiosa imagem da dor que o pobre São Sebastição devia estar a sentir naquela fria noite ventosa e ainda todo espetado de setas, veio à mente de algum deles que convocou os outros.
Treparam para cima dos arcos e depois de alcançarem o santo, arrancaram-lhe as setas.
Desde esse dia, ninguém ousou restituí-las e não se sabe mesmo de nenhum outro São Sebastião que não tenha setas atravessadas ao corpo, que não o de Coimbra.
Antes de descerem, os estudantes deixaram pendurada uma placa com os dizeres: "Basta de tanto sofrer."