Ontem fui a uma exposição de artesanato português que está aberta no Fórum da Cultura da UFJF. As peças vieram de Portugal especialmente para a mostra e foi trazida com intermediação da Sociedade Portuguesa, o grêmio dos lusitanos aqui em Juiz de Fora.
As peças sacras tinham uma tristeza tão grande nos olhos. Santas Maria com os olhinhos cheios de tristeza e Sãos Sebastião com expressão de desfalecimento (esse daí também não é para menos, tinha umas duas dúzias de flechas atravessando o corpo).
O artesanato também é bem expressivo nas roupas típicas de aldeias de pescadores no argarve ou de pastores de trás-dos-montes. Sempre nas cores laranja, verde, vermelha, daí uma alegria discreta. Também chamam a atenção a cerâmica e os azulejos, esses são fenomenais. Havia uma peça em azulejo que trazia a imagem de uma mocinha de uns 13 anos colhendo flores com seu vestido de camponesa sendo observada por um homem a cavalo que parecia suplicar por um olhar seu, uma sutileza e uma sensibilidades nos detalhes que me deixou emocionado.
A tristeza é tão típica do povo português que eu sinto no meu sangue muitas vezes esse chamado à melancolia. Muitos dizem que a razão dessa tristeza vem do tempo das navegações, quando milhares se lançavam aos mares em busca de rotas comerciais, ou de novas terras. Inclusive o famoso poema "Mar Portuguez", de Fernando Pessoa lembra bem esse sofrimento nos versos: "Por te cruzarmos, quantas mães choraram,/Quantos filhos em vão rezaram!/Quantas noivas ficaram por casar/Para que fosses nosso, ó Mar".
Também, dizem uns, serviu a ditadura salazarista que durou 30 anos para embrutecer os espírito do povo português. Com uma doutrina fascista e de censura às liberdades, prevalecia a máxima autocrática de "manda quem pode, obedece quem tem juízo", um deboche contra o poder do povo do mais ridículo gosto.
A verdade é que há nos olhos uma saudade velada que não pode ser nunca admitida. Saudade de onde? Saudade de quem? Por que saudade? São perguntas que não tem resposta, é um sentimento tão natural e típico que ninguém fala dele, está expresso, é uma reação natural à vida.
Em mim mesmo já percebi muito clara essa tendência em ver essa saudade imemorial, veladamente escondida nalgum canto, de repente desperta. Saudade mesmo, das grandes e verdadeiras, é bom sentir, pois mostra que o coração é fiel e não fugaz, se o amor faz falta é porque existe. É preciso não confundir com a nostalgia, que é a apologia do passado, imortalizada na expressão que muitos idosos adoram e que é um clichê consagrado 'ah, no meu tempo é que era bom', como se hoje também não fosse seu tempo! Nosso tempo é sempre o tempo atual, o outro é memória, se for tanto. A boa tristeza de saudade é um sentimento muito quieto e muito particular.
No artesanato em mostra no Fórum da Cultura percebe-se muito bem que não se trata de uma tristeza de remorso, vingativa ou desesperada, mas conformada, que em muitos momentos é feliz. Sim, uma tristeza que tem momentos de felicidade, como que o artesanato tivesse materializado essa verdade da vida de que ninguém é feliz todo o tempo, nem triste todo o tempo, mas há épocas mais felizes e outras mais tristes.