segunda-feira, janeiro 24, 2005

Reengenharia dos sentimentos

Minha amiga Diana tem uma péssima mania de explicar todos os eventos da vida com a simplista visão de que "o destino mágico encontrou seu fim agora".
Como o bordão dos locutores esportivos depois de gols, como por exemplo de Sílvio Luís com o seu "é mais um gol brasileiro, meu povo!", ou ainda desse personagem ímpar da imprensa desportiva brasileira quando da perda de um gol feito: "pelas barbas do profeta", todos sabem que ele vai dizer isso. Com Diana é o mesmo no aspecto da predestinação de todas as coisas e seu bordão com pretensões poéticas: "o destino mágico encontrou seu fim agora".
Os espíritas têm uma opinão parecida da sua máxima de que 'o acaso não existe'. Da mesma maneira, milhares de pessoas compartilham da opinião quase mágica de que tudo está escrito.
Mas eu não acho isso. Na verdade fico mesmo incomodado com essa visão de predestinação de tudo. Como é triste imaginar que quem vamos amar foi colocado no nosso caminho pelo destino e o mesmo destino nos fez magoá-lo, fez com que o amor acabasse, fruisse para alguma greta e se perdesse, ou mesmo fazer apaixonar para depois assentar seu imenso "não" com uma traumática separação, imagine ainda quantas noites de insônia, quantos pensamentos de desespero, quantas ameaças veladas cheias de fúria de todas as pessoas do mundo e tudo isso já está programado!
Não, é triste demais pensar assim. Digo pra minha querida amiga: "ora, não é assim... onde fica o livre-arbítrio?" e ela secamente responde: "no mesmo lugar em que fica a vontade, ou seja no campo das coisas submetidas às circunstâncias e essas circunstâncias é que estão já predestinadas, ou seja, está tudo montado como numa perfeita engenharia".
Uma perfeita engenharia de não haver como fugir! Como a mais perfeita das penitenciárias, onde nem o mais astuto e bem relacionado dos detentos poderia sonhar em escapar! Mas eu já agora tenho bolado meu plano de fuga, sim, é o que tenho feito! E garanto a todos que plano melhor não poderia haver nesse mundo de predestinação e circunstâncias armadas: vou promover uma lenta, gradual e progressiva reengenharia de todos os sentimentos! Sim, pois sem as circunstâncias o que será do destino que teria? Ele será outro, oras, é uma conclusão lógica e simples e para mim basta, não vou entrar em circunstâncias que influenciaram a reengenharia, paramos no primeiro degrau que já basta para ser suficiente para alguém que segura-se aos seus sentimentos como um trapezista segura-se num trapézio. Pois com a reengenharia vamos retirar as redes de proteção! Sim, não mais esse dispositivo de segurança que é para quem acha que no fim não vai dar certo! Eu sei que vai dar certo, sim, do fundo do coração tem de dar certo, não vou mais pensar na morte, mas na glória!
Minha reengenharia irá além do amor (mas não muito além) e compreenderei que afinal não vale a pena desconfiar tanto e me importar tanto: no fim quase tudo acaba do mesmo jeito e à grande partida que há no fim sobra o grande socialismo estéril que a morte promove!
Não mais vou apostar em cavalos que descendem de campeões, a partir de agora vou dar uma chance a quem parece ser menor, mas que eu nunca acreditei que pudesse superar a falta de credenciais de procedência.
Vou perceber que além das burocracias cansativas e monótonas que cercam todas as coisas da vida há um toque humano em todas elas, um toque de alguém que ama, sofre, sonha e se angustia.
Por fim vou amar não para mim, mas para o mundo inteiro e vou, com esse gesto, desprender todas as expectativas egoístas que eu tenho dessa instituição chamada 'amor'. Não quero um amor para me fazer feliz, isso é um fim em si mesmo... agora quero um amor que seja feliz por si mesmo, que de tão contente contagie o mundo inteiro e quem sabe me faça com esse efeito do meu amor, um sujeito que sorria antes de dormir e sem ninguém ver.
Pois vou começar a fugir agora! Vou iniciar a grande reengenharia de tudo e não vou querer mais as velhas circunstâncias: que venham as novas, cheias das surpresas que amanhã eu não vou conseguir prever (ah! grande sonho da minha vida!) Chega da prisão do destino, quero trapacear para enganar esse inimigo injusto e pouco criativo! A vida merece menos tédio e mais copos de vinho caseiro! :D