Desde que visitei o Museu Mariano Procópio pela primeira vez, aos 13 anos, soube que era um lugar especialíssimo. Não porque o pequeno fascistinha que em mim habitava via nas memórias da elite de outrora o sentido da mantença na nossa atual condição, mas porque lá era a casa do meu país em muitos sentidos, da própria natureza originária do Brasil.
Fundado no início do século XX pelo herdeiro de uma das maiores fortunas do país, o senhor Alfredo Ferreira Lage, o Mariano Procópio foi o primeiro museu de Minas Gerais possuindo um acervo eclético e muito rico.
Muito graças ao amor do fundador e seu pai pela história e memória da cultura nacional, as peças foram colecionadas durante duas gerações inteiras, sendo que a cereja desse bolo, com certeza, são as peças da Corte Imperial do Brasil, leiloadas logo depois do golpe que institiu a república: trata-se de um acervo maravilhoso, com gravuras francesas em porcelana, armas de época, telas a óleo dos séculos XVIII e XIX, jóias e roupas oficiais, incluindo o manto de coroação de Dom Pedro II.
O bom gosto e a beleza das peças de uma maneira geral afastam qualquer classificação como museu de nostalgia ao Império do Brasil. O acervo como um todo é riquíssimo e incomensuravelmente belo. Dentre as telas a óleo da minha predileção, a mais querida é "Stella", de autoria do Visconde de Taunay. A pintura é um retrato que o visconde fez de sua filha antes dela se casar e também esse quadro serve como cartão postal do museu, cartão esse que tenho comigo e uso de marcador de livro. Pelo sem número de vezes fiquei decifrando a expressão enigmática de Stella no quadro, de uma doçura e pureza infinitas misturadas a uma sutil tristeza, quase imperceptível: obra de um tempo em que a sensibilidade, o talento e a beleza tinham seu lugar à cabeceira da mesa.
Também há obras de pintores estrangeiros famosos e pinturas brasileiras célebres como "Tiradentes", de Pedro Américo.
Sem dúvida o lugar mais charmoso e agradável de todo o museu é a câmara de exposição das pinturas famosas, sem dúvida, um lugar priviliegiado nessa terra desde a sua construção com o teto à 10 metros de altura, seja pela boa formação, nem grande e nem pequena, que proporciona um conjunto e dá alguma simetria muito apropriada à exposição.
Mas a verdade é que a grande parte do acervo encontra-se guardada, devidamente protegida nos três andares subterrâneos de câmaras frigoríficas de conservação. Esse material que não está exposto, que fique bem claro: apenas for falta de espaço, engloba peças de arte dos séculos XVIII e XIX, esculturas, pinturas, comendas, medalhas, enfim, relíqueas do nosso país.
Entre os tesouros desse acervo secreto, destaco um que sempre vem a minha lembrança por ser relativo a um evento muito importante e significativo: um imenso estandarte em prata, cobre e com detalhes em ouro, comemorativo à participação do Imperador Dom Pedro II na exposição universal de Paris de 1889, a mesma exposição universal em que foi inaugurada a Torre Eiffel, comemorando-se os 100 anos da Revolução Francesa. O estandarte agradace a contribuição do Brasil ao desenvolvimento tecnológico, assim como parabenizava o imperador por seu interesse na evolução científica.
A ampliação do museu para a exposição do restante das obras vem sendo negociada há quase 10 anos e implica tão somente na cessão pela 4ª. Brigada de Infantaria Motorizada de um magnfífico palácio do século XIX que atualmente serve de residência ao oficial comandante, um resquício sujo e pretensioso do elitismo militarista à época da ditadura...
Fiodor Dostoievski disse algo significativo a esse respeito na sua obra "A Possessão": “Se um grande povo não acredita que a verdade se encontra nele mesmo [...] se não acredita que ele sozinho está apto e destinado a levantar-se e salvar todo o resto pela sua verdade, transforma-se de uma vez em material etnográfico, e náo mais em um grande povo [...] Uma nação que perde essa fé deixa de ser uma nação.”
VIVA O BRASIL, apesar dos dissidentes e dos generais.