quinta-feira, dezembro 23, 2004

A pequenina luz indecifrável

Olho nos teus olhos, amiga. Vejo fogo e lágrima e apelo! Amiga, lembra daquelas lindas palavras que sairam da tua boca, mesmo por sofrimento, são tuas! Deixas-me aqui no peito a tua sensação de desatino, de deixar no mar as boias e a nado atravessar o canal que separa o real do absurdo...
A tempestade cai indiferente às vítimas que faz e os incêndios e os cadáveres e o medo das crianças não fará com que os trovões fiquem no céu, eles vão despencar de qualquer jeito e meus braços tentam intimidá-los debilmente, numa demonstração de coragem e de fé que meu coração ordena.
Quantas vezes tentei compreender esses pensamentos de ruína e tristeza, de ciúmes, de paixão doente, de ser verde por dentro e negro por fora sem que ninguém note nada e caminhando morto entre os vivos ter de fingir todo o tempo para que não fiquem perguntando "você está bem?".
Na vida tão curta que já tive, vivi dores fundas, amiga, e vejo-as agora em ti numa reprise a preto-e-branco sem permissão pra ir ao banheiro antes do fim da sessão, e obrigado a rememorar o roteiro, as falas, as intrigas e as surpresas que prendem a atenção dos que vêem pela primeira vez, mas que para mim são piadas de péssimo gosto.
Quem me dera poder arrancar-te desse limbo de maldade, desse labirinto, abraçar-te forte e dar ao seu olhar uma vista linda de fim de tarde pra ele se acostumar de novo com a beleza que é seu destino natural, segurar forte seu corpo pela cintura e levantar-te pra que a chuva chegue ainda antes no teu rosto, girando nós dois numa única peça da alegria.
Quem me dera, amiga, dar-te outro destino, mas nessa hora, nessa tristíssima e negra hora, tens de estar bem sozinha contigo mesma para ouvir na voz do silêncio a razão do amor, da vida, das certezas e de todos os dramas do mundo e nessa voz mágica que os que te amam liberam em ondas contínuas e uniformes tens de ouvir nosso amor e mais, a certeza do teu amor e da tua boa vontade para deixar-lhe outra esperança.